Consumo de canábis aumenta risco de esquizofrenia em jovens
Embora muitos tenham deixado de ver a canábis como uma substância perigosa ou prejudicial, ainda há muito que os especialistas não sabem sobre esta substância, incluindo a razão por que algumas pessoas desenvolvem esquizofrenia pelo seu consumo, ainda que moderado.
Estima-se que 200 milhões de pessoas usam canábis em todo o mundo. A par do álcool e do tabaco, é a droga mais usada em muitos países. Embora muitos tenham deixado de ver a canábis como uma substância perigosa ou prejudicial, ainda há muito que os especialistas não sabem sobre esta substância, incluindo a razão que leva algumas pessoas desenvolverem esquizofrenia pelo seu consumo, ainda que moderado.
A comunidade científica estuda a ligação entre o uso de canábis e a esquizofrenia desde o final dos anos 1960. Desde então, os estudos confirmaram uma ligação entre o uso desta substância e o risco acrescido de desenvolver esquizofrenia. Até agora, a maioria das evidências sugeria que qualquer ligação se deve ao uso frequente e em altas dosagens ou que a predisposição genética pode ser um fator determinante, assim como um histórico familiar de esquizofrenia. Uma revisão sistemática recente, contudo, mostra agora que não há diferença no risco de desenvolver esquizofrenia entre o consumo habitual e o esporádico.
Frequência de consumo de canábis
Para entenderem melhor se o uso frequente de canábis aumenta o risco de os adolescentes desenvolverem esquizofrenia, os cientistas analisaram todo o material publicado sobre o tema entre 2010 e 2020 – incluindo estudos revisões a estudos anteriores, com dados entretanto comprovados. Estas revisões concentraram-se em adolescentes com idade entre os 12 e os 18 anos. Descobriu-se que os consumidores habituais de canábis tinham seis vezes mais probabilidades de desenvolver esquizofrenia comparativamente com os que nunca a consumiram. O consumo esporádico equivale a duas vezes ou menos por semana e o frequente a uso diário ou quase diário.
Embora as conclusões tenham confirmado a ligação o consumo de canábis e a esquizofrenia, persistem limitações neste estudo que devem ser tidas em conta. Uma é a forma como o consumo de baixa e alta frequência é definido. A definição varia entre os estudos, mesmo aqueles analisados pela revisão, já com dados entretanto confirmados – o que acaba por dificultar as comparações. Tal como outras drogas, a canábis também varia em potência – e quanto mais forte, maior o risco de alguém desenvolver problemas, como esquizofrenia, mesmo que o consumo não seja frequente.
Muitas incógnitas
Embora seja possível observar claramente que há uma associação entre o consumo de canábis e a esquizofrenia em jovens, ainda não é possível determinar com certeza absoluta que a canábis seja a causa. A adolescência e o início da idade adulta são os períodos mais comuns durante os quais as pessoas desenvolvem esquizofrenia. Embora possa ocorrer em qualquer idade, tende, em média, a acontecer no final da adolescência e início dos 20 anos (para homens) e final dos 20 e início dos 30 anos (para mulheres). A adolescência também é a altura em que muitos jovens começam a experimentar drogas – inclusive a canábis, o que aumenta as dúvidas sobre se esta substância leva realmente os jovens a desenvolverem esquizofrenia.
Alguns estudos sugerem igualmente que as pessoas com maior predisposição genética para desenvolver esquizofrenia também podem ser mais propensas a consumir esta substância. Porém, e mais uma vez, ainda que não haja provas diretas e definitivas de que o consumo causa esquizofrenia, é certa a probabilidade de que a canábis potencia a esquizofrenia: pode portanto não ser a causa, mas aumenta as probabilidades.
Estratégia de comunicação difícil
O outro problema é o de não ser possível por enquanto prever com antecedência quais os consumidores que também desenvolverão esquizofrenia. E isto dificulta as mensagens de saúde pública, pois não há como direcionar informações especificamente para aqueles que correm maior risco de desenvolver esquizofrenia. Uma estimativa sugere mesmo que seria necessário impedir 10.500 jovens de consumirem canábis para que se evitasse um caso de esquizofrenia – mostrando como qualquer estratégia de saúde pública provavelmente seria ineficaz. Os jovens também podem não querer prestar atenção eventuais campanhas de prevenção, especialmente se já tiverem tido alguma experiência positiva com a canábis. Algumas das incertezas que subsistem sobre a relação direta entre o consumo e a doença podem contribuir também para o falhanço dos avisos de saúde pública sobre os potenciais riscos de que a canábis causa esquizofrenia – sendo certo, volte a notar-se, que os potencia.
Incidência de esquizofrenia na população
A incidência de esquizofrenia na população mundial é de cerca de uma em cada 300 pessoas – enquanto aqueles que consomem canábis têm um risco pelo menos três vezes maior de desenvolver esquizofrenia, uma em cada 100. Embora não haja certeza absoluta de que a causa esquizofrenia, há clareza na afirmação cientificamente comprovada de que que o uso potencia o risco, como demonstra o último estudo: tanto o baixo consumo quanto o uso frequente comportam o mesmo risco.
Sinais precoces de problemas de saúde mental
Embora as perceções de segurança da canábis tenham mudado nos últimos anos – especialmente com muitos países a legalizarem o seu consumo, como, aliás, pretendem o PS e o Bloco de Esquerda – ainda é importante que as pessoas pensem de forma cuidadosa sobre os riscos antes de consumir canábis, principalmente os jovens que já podem apresentar sinais precoces de problemas de saúde mental, já que a canábis pode piorá-los.
Luís Martins
Siga a Impala no Instagram