“O meu HPV: O vírus responsável pelo cancro do colo do útero”
Testemunho real sobre o vírus HPV, responsável pelo cancro no útero. “Ponderei bastante, decidi contar a história dos últimos meses para desmistificar este problema.”
“Ponderei bastante escrever ou não sobre este assunto. Mas, agora que a questão está praticamente resolvida, decidi contar a história dos últimos meses para desmistificar o vírus HPV, vírus responsável pelo pelo cancro no útero.
Depois de uma consulta ginecológica de rotina, na qual fiz a habitual citologia, ligam-me da clínica. «A doutora quer vê-la por causa dos resultados». Só. Angústia, pânico. O apelo à racionalidade: «Não vai ser nada, vais ver». Nova consulta. Resultado: lesões no útero, provocadas pelo vírus HPV.
PAUSA PARA ESCLARECIMENTO: cerca de 75 por cento da população sexualmente ativa entra, em algum momento, em contacto com alguma estirpe do vírus do papiloma humano (HPV). Na maioria dos casos, o organismo acaba por eliminar naturalmente o vírus. Em alguns casos, o vírus provoca lesões externas, noutras internas. Só numa fase muito avançada é que há sintomas. Portanto, o HPV (o vírus responsável pelo cancro do colo do útero) é silencioso.
Continuando: o grau das lesões, explica a médica, significa que vou ter de fazer um outro exame – uma colposcopia – para avaliar a extensão e a gravidade. Uma colposcopia é, basicamente, a introdução de um microscópio para observação das lesões. Pode (ou não) incluir também a recolha do tecido danificado. No meu caso, incluiu.
Do consultório para o hospital, a espera não é muita – uns 15 dias – mas torna-se insuportável. Primeira tentação? Googlar, claro. E o que nos aparece à frente é mais assustador do que tranquilizador. Riscos de infertilidade, hemorragias, dores, perspetivas antagónicas. Nada bate certo. E os fóruns onde a malta troca experiências também não ajudam. Umas dizem uma coisa, outras dizem outra. Em quem acreditar?
Dia do exame. 10 da manhã, hospital de Santa Maria. A consulta não atrasa. A médica explica o procedimento. E ala para a marquesa ginecológica. O que tinha lido que seria um procedimento relativamente simples e rápido… não é assim tão simples e rápido. É doloroso, intrusivo. A posição é tudo menos confortável. Sinto-me mal, a tensão desce. Tenho suores frios. Podiam-me ter avisado que devia ter vindo acompanhada.
Terminada a colposcopia a médica mostra-me num ecrã o resultado da observação. As lesões requerem uma nova intervenção. Chama-se conização (porra, que irónico…). A médica alerta-me: «Prepare-se psicologicamente». E porquê? Porque vai doer.
A recuperação da colposcopia é pior do que imaginava. As dores são semelhantes às menstruais, mas mais persistentes. E mais fortes. Mas… aguenta-se.
A conização consiste na remoção de uma parte do colo do útero (em forma de cone, daí o nome). Para tal, é utilizado um laser (ou ansa diatérmica) o que significa, na prática, que em determinado momento vai cheirar a porco queimado. Desculpem, não encontro comparação mais feliz do que esta.
Regresso ao Santa Maria. Não penso noutra coisa há 15 dias. Tenho pesadelos, choro. Tenho medo do «e se…?». Penso (e raios me partam se quem já passou por isto não pensou o mesmo) «e se não posso ter filhos?». Porque uma coisa é (para já) não os querer, outra é não poder tê-los. A espera mexe com a nossa cabeça. Com a nossa auto-estima. Com tudo. «O que é que eu fiz de mal?» é a pergunta, a mais estúpida, mas a mais constante. Sinto-me uma merda. Mas lá vou eu.
Preparada que estava para a dor, acabou por não ser assim tão mau (dentro das dores lancinantes, do cheiro a porco chamuscado e da meia hora que acabou por ser quase uma hora). A enfermeira, sempre atenciosa, foi conversando comigo (admirável para quem faz este procedimento umas 500 vezes por semana).
Terminado este procedimento, eis as precauções: repouso, um mês sem tomar banhos de imersão/mar/piscina, medicação, abstinência sexual. E as dores, claro. E as hemorragias.
Ao fim de um mês, voltei ao hospital para uma nova inspeção. Tudo ok. Para já, estou livre do HPV. Daqui a seis meses nova avaliação. Depois, logo se vê.
Não conto esta história para que tenham pena de mim. Eu não tenho. Sei que sou uma sortuda: primeiro porque o problema foi detetado a tempo, segundo porque foi tratado. Podia ter sido diferente, como é para tantos milhares de mulheres.
Para as mulheres que leram isto e têm medo da próxima visita ao ginecologista… não tenham. É precisamente essa visita que vos pode salvar. Não adiem as consultas, não tenham medo de fazer perguntas. Façam os exames (citologias, mamografias, etc) que são precisas consoante a vossa idade. E não pensem que o facto de terem parceiros fixos e/ou não terem relações sexuais são fatores atenuantes. Não são.
Por último… o sistema público de saúde funciona mesmo. Passei da Unidade de Saúde Familiar da minha zona para o hospital de Santa Maria. O processo foi rápido, as consultas a horas, quando precisei de falar com a médica consegui sem qualquer problema. E isso deu-me, ao longo destes meses, a segurança e a confiança de que precisava.
E pronto, era isto. Agora toca a ligar ao ginecologista para marcarem essa consulta.
Raquel Costa
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