Vício das séries é adição tão complicada como qualquer droga

Plataformas de streaming como a Netflix introduziram um novo modo de assistir a este tipo de programas: tudo de seguida. Novo estudo, porém, conclui que ver séries pode ser adição tão complicada como qualquer droga.

Vício das séries é adição tão complicada como qualquer droga

Longe vão os tempos em que se esperava uma semana para ver o episódio seguinte da séries favoritas. As plataformas de streaming (transmissão contínua), como a Netflix e a Amazon, por exemplo, introduziram um novo modo de assistir a este tipo de programas: todos seguidos. Há quem passe madrugadas e dias a ver cinco e seis capítulos sem parar.

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Séries para todos gostos

Paulo Santos sempre gostou de ver séries na televisão. Assume que o gosto nasceu com as novelas que via religiosamente com a avó, que viveu com ele até aos 15 anos. “Aquelas horas eram sagradas. Eu e a minha avó não perdíamos episódios de nada. Primeiro foram as novelas, depois Dallas, Uma Casa na Pradaria, Fame – mítico – e, até o MacGyver, a minha a avó gostava de ver.

“Entrávamos completamente no imaginário das diferentes histórias e, entre cozinhar, arrumar a cozinha e fazer os trabalhos da escola, organizávamos tudo para à hora certa estarmos sentados em frente à televisão. Não havia pipocas, mas a minha avó fazia lanchinhos para, com um tabuleiro no colo, brindarmos com um gosto saboroso, o enredo. Agora, olhando para trás, acho que tudo aquilo fazia parte de um ritual muito engraçado. Quem dizia não gostara nada daquela cumplicidade eram os meus pais.”

Maratonas a ver séries

Fame, série que foi exibida de 1982 a 1987

Tanto um como outro eram mais dados a livros e pouco a televisão. Gostava do que viam entre mim e a minha avó, mas faziam questão de resmungar sistematicamente, porque quem mandava na televisão, lá de casa, éramos nós!”. Trinta anos depois, Paulo continua completamente viciado em ver séries e faz verdadeiras maratonas para ver o maior número de episódios.

“Muitas vezes já tenho imenso sono mas penso: ‘só mais um’. Há histórias que é mesmo difícil desligar. Quando chego ao fim e penso que só dali a um ano ou oito ou nove meses é que vou poder voltar a ver aquilo fico quase desesperado. A solução passa, muitas vezes, pela substituição. Tento arranjar outra história que me prenda tanto como a anterior. Muitas vezes resulta. Parece um vício.” Não parece. A verdade, é que é.

Dependência física e psicológica assustadora

Anatomia de Grey, Temporada 15

De acordo com um estudo elaborado do canal Fox, ver séries pode ser uma adição tão complicada como qualquer droga. Nessa análise, coordenada pelo neurocientista Kai-Markus Müller, concluiu-se que não é por acaso que existem episódios de histórias que sentimos que são viciantes.

Para uma amostragem de 74 pessoas, entre os 18 e os 47 anos, foram exibidas algumas cenas de séries (escolhidas pelos próprios indivíduos), enquanto lhes foram sendo analisadas a pulsação, a atividade cerebral, a temperatura corporal, o nível hormonal, a frequência respiratória, o fluxo sanguíneo e o movimento dos olhos.

Conteúdos com emoções fortes

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A dada altura, simulou- se uma falha técnica e o ecrã deixou de funcionar. As reações sucederam-se e não houve indiferença perante tal falha. Suores, descida da temperatura corporal, respiração mais profunda ou suspensa foram alguns dos sintomas detetados. Segundo Müller, este é um tipo de comportamento idêntico aos que os aditos em cocaína manifestam quando lhes é mostrado (e imediatamente retirado) um pacote com droga.

Nesse sentido, também se chegou a conclusão de que a maioria das pessoas prefere conteúdos que suscitem emoções fortes. Numa análise hormonal revela -se que o efeito é, geralmente calmante, mesmo quando se trata de cenas de terror ou violência. Outro dado curioso tem a ver com o facto de a história contada no decorrer de um episódio – geralmente de 40 minutos – não provocar sentimentos de ódio ou repulsa.

Por outro lado, existem personagens que provocam sentimentos de grande êxtase só pelos simples facto de surgirem no ecrã. É o caso de Sheldon, de A Teoria do Big Bang, no topo dos mais viciantes, Guilherme Tell, de The Walking Dead, ou Patrick Dempsey quando fazia parte do elenco de Anatomia de Grey.

Adultério Netflix: Saiba o que é

Ascensão e a queda do traficante Pablo Escobar

Neste estudo foram ainda analisados outros comportamentos que não deixam de ser preocupantes. É o caso de quando um casal programas ver uma série em conjunto. Trata-se de um compromisso que não pode ser quebrado. Contudo, a ansiedade em ver o que se segue na história conduz a que, por vezes, alguém quebre a regras.

Às escondidas do companheiro, assiste-se a um novo episódio da série. Este comportamento já foi batizado com o nome da plataforma que originou e fortaleceu todos estes comportamentos, Adultério Netflix. Para evitar este tipo de questões, Paulo Santos e a mulher estipularam regras.

“Cada um tem o seu ritmo”

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“Lá em casa, tanto eu como a minha mulher, ambos viciados em séries, não as vemos em conjunto. Cada um tem o seu ritmo. Por outro lado, também estipulámos que só ao fim de semana, na noite de sexta, estaríamos inteiramente dedicados a estes visionamentos, pontualmente nas tardes de domingo de inverno e a chover.

“Se não estabelecermos estes limites, entraremos num tipo de vida de ‘hibernação’ que, como qualquer outro vício conduz a problemas de exclusão social bem como algumas questões relacionadas com a ‘abstinência’. Apesar de tudo, há vida real para viver, fora do pequeno ecrã.”

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