Chefe da UNRWA pede a membros da ONU que impeçam desmantelamento da agência
O diretor da Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinianos (UNRWA) exortou hoje os Estados-membros da ONU a usarem “toda a sua influência” para impedir a aplicação da legislação aprovada por Israel para banir as atividades da organização.
Numa conferência de imprensa em Genebra, Suíça, para um novo ponto da situação nos territórios palestinianos ocupados, Philippe Lazzarini focou a sua intervenção na legislação adotada a 28 de outubro passado pelo parlamento israelita (Knesset), que visa banir as atividades da UNRWA, organismo que Israel acusa de pactuar com o movimento islamita palestiniano Hamas, e que deverá entrar em vigor em janeiro do próximo ano.
“Vim aqui muitas vezes falar da situação financeira desesperada da agência, mas hoje estamos num ponto ainda mais grave: não só há uma crise financeira que é existencial, como há uma crise política, pois há uma vontade política de desmantelar a agência da parte de um Estado-membro das Nações Unidas, o Estado de Israel”, apontou o responsável.
Philippe Lazzarini reiterou que a UNRWA “é insubstituível” e “não há plano B” para colmatar o seu eventual desmantelamento, pois não há nenhuma outra agência no seio da ONU capaz de fazer o mesmo trabalho de assistência aos refugiados palestinianos, nem mesmo o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR), como sugere Israel.
“A UNRWA é um prestador direto de serviços públicos a toda uma população, não existe nenhuma outra entidade das Nações Unidas capaz de preencher o vazio deixado pela agência”, disse, alertando que se a agência “não puder funcionar nos territórios palestinianos ocupados, a responsabilidade de prestar serviços aos palestinianos, e de suportar os custos desses serviços, não caberá às Nações Unidas, mas sim a Israel, enquanto potência ocupante”.
De acordo com Lazzarini, “mesmo que a guerra termine amanhã, o futuro de Gaza parece sombrio” e, a confirmar-se, “a aplicação da legislação do Knesset e a exclusão forçada da UNRWA de uma transição terão consequências catastróficas” para os palestinianos, pois o desmantelamento da agência “fará colapsar a resposta humanitária das Nações Unidas, que depende em grande medida das infraestruturas da agência”.
“Na ausência de uma administração pública ou de um Estado capazes, só a UNRWA pode proporcionar educação a mais de 660 mil raparigas e rapazes em Gaza. Estaremos dispostos a deixar que seja negado a estas crianças o direito à educação? Sacrificar toda uma geração e lançar as sementes da marginalização e do extremismo? É também aterrador que pessoas que sofrem uma guerra devastadora possam ficar sem cuidados de saúde básicos. Antes da guerra, a UNRWA respondia a 70% a 80% das necessidades de cuidados de saúde primários em Gaza”, assinalou.
Também na Cisjordânia, prosseguiu o representante, “o colapso da UNRWA privaria pelo menos 50 mil crianças da educação e meio milhão de refugiados palestinianos dos cuidados de saúde primários”.
Regozijando-se com o que classificou como uma “extraordinária solidariedade” manifestada pela comunidade internacional após a aprovação das leis pelo parlamento israelita, Philippe Lazzarini lançou vários apelos aos Estados-membros das Nações Unidas no sentido de impedirem que a UNRWA seja impedida de exercer a sua atividade.
“Peço aos Estados-membros que atuem no sentido de impedir a aplicação da legislação contra a UNRWA. As alterações ao mandato da UNRWA são prerrogativa da Assembleia-Geral [da ONU], e não dos Estados-membros a título individual”, afirmou, acrescentando que também é fundamental que os membros das Nações Unidas “assegurem que qualquer plano de transição política defina o papel da UNRWA”, pois “a agência deve concluir progressivamente o seu mandato no quadro de uma solução política e, nos territórios palestinianos ocupados, entregar os seus serviços a uma administração palestiniana com poderes para tal”.
O chefe da agência pediu ainda aos Estados-membros “que mantenham o financiamento da UNRWA e que não retenham ou desviem fundos com base no pressuposto de que a agência deixará de poder funcionar”, lembrando que “o custo da prestação de serviços essenciais, incluindo a educação e os cuidados de saúde, durante uma transição será imenso”.
“O que está hoje em jogo não é apenas a UNRWA enquanto instituição, é o futuro coletivo dos refugiados da Palestina”, advertiu.
A UNRWA foi criada em 1950 pela ONU e presta serviços sociais a mais de cinco milhões de refugiados palestinianos – muitos deles descendentes das centenas de milhares de pessoas deslocadas pela criação do Estado de Israel – que vivem atualmente na Faixa de Gaza, na Cisjordânia, no Líbano, na Síria e na Jordânia.
Em março passado, Israel acusou “um número significativo” de trabalhadores da UNRWA de “serem membros de organizações terroristas”, em particular do Hamas, o que levou 16 países a suspender ou congelar o seu financiamento, privando de repente aquele organismo de 450 milhões de dólares e pondo em causa a continuidade das suas operações.
Contudo, em meados de abril, a investigação externa liderada pela ex-ministra dos Negócios Estrangeiros francesa Catherine Colonna excluiu que as autoridades israelitas tivessem apresentado provas que fundamentassem as alegadas ligações terroristas atribuídas a vários funcionários da UNRWA.
ACC // SCA
By Impala News / Lusa
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