«Chamo-me Bruna, sou estudante e faço pornografia ao vivo e em direto»

«Sou pornografia ao vivo e em direto.» Bruna Valentino conta sem preconceitos nem tabus ao Portal de Notícias como é ser trabalhadora do sexo online em Portugal.

Bruna Valentino (nome artístico) tem 24 anos. Vive com os pais em Lisboa, é estudante universitária de dia e à noite é CamModeltrabalhadora do sexo que faz espectáculos eróticos através de vídeos online, em direto. Para além dos shows, nos quais faz striptease e se masturba, Bruna também vende fotos, vídeos e até comercializa cuecas. Mas vamos por partes. Não é do dia para a noite que uma jovem se torna na «CamModel mais famosa de Portugal».

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«Apesar de tímida no que diz respeito à parte sexual das minhas relações, sempre tive mente aberta»

Tudo começou há sete anos. Bruna encontrou no prazer uma vocação. Por curiosidade, com o namorado que tinha na altura, começou a ver sites internacionais de CamModels. «Apesar de ser tímida, no que diz respeito à parte sexual das minhas relações, sempre tive mente aberta. Começámos a ver CamGirls. Achávamos engraçado e, na altura, ele comentou que achava que eu tinha perfil para ser CamModel. Estava sempre a incentivar-me. ‘Tu tens de fazer isto’, dizia-me.»

Os incentivos do parceiro, porém, nunca passaram de elogios. Bruna nunca mais pensou no assunto. Em 2016, já solteira, lembrou-se «por graça» de revisitar os sites das CamModels. «Num desses sites internacionais, vi um anúncio. ‘Tu também podes ser CamGirl. Inscreve-te!’ E, sem pensar muito, decidi experimentar.»

De ganhar trocos a trabalhar 5 horas diárias

Bruna Valentino
Bruna Valentino

Quando começou a ligar câmara como CamModel, Bruna encontrou um lugar onde tinha prazer, divertimento e, no final do dia, era paga. Sem grandes ambições, «ficava lá umas horinhas, sem horários ou obrigações, e ganhava uns dinheiros, que ajudavam para ir jantar fora ou dar uns passeios».

Quando foi investigar como estava o mercado das CamGirls em Portugal, deparou-se com uma fraca oferta deste serviço, apesar de o exponencial crescimento da indústria do sexo no nosso país, nos últimos anos. «A oferta era muito reduzida e, por vezes, muito amadora. Decidi arriscar, levar as coisas mais a sério e tentar ser uma referência na indústria.»

Bruna trabalha das 22h00 às 03h00, seis dias por semana. Apenas tira uns dias quando tem menstruação. «Acordo às 06h00 para ir para a faculdade e deito-me às tantas da manhã. Por vezes, é muito duro.»

Para entrar no mercado português, começou por fazer como as outras CamGirls portuguesas. Colocou anúncios nos classificados. Não foi preciso muito tempo para se tornar «na nova sensação». «Percebi que estava a correr bem. Que havia realmente muita procura. As coisas foram fluindo. Muitos clientes começaram a pedir para eu fazer um site para divulgar e mostrar melhor o meu trabalho. Tendo em conta que o site ia dar-me credibilidade, decidi fazer um. Tenho muito orgulho. Fiz o site sozinha. Depois, quando o lancei, em fevereiro deste ano, foi uma bomba!»

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Ao mesmo tempo, a estudante universitária foi expandido o negócio. A personagem ‘Bruna’ foi adquirindo contornos de alter-ego. Apesar de a ‘Bruna’ não ser propriamente «outra pessoa», é uma extensão da sua própria personalidade. Que, por sua vez, também tem vida própria.

«É difícil explicar. Eu também sou a Bruna. Mas em algumas coisas sou muito muito diferente dela. Tudo o que não consigo fazer, a Bruna faz. Conforme ligo o computador, a minha personalidade muda. Visto-me, ligo a câmara e deixo de ser envergonhada e tímida e fico super relaxada. Perco os complexos e fico livre. É um processo natural.»

Uma vida paralela: O medo dos pais e colegas descobrirem

Bruna Valentino
«Sou pornografia ao vivo e em direto»

Para manter a identidade anónima, Bruna aparece nos shows apenas do pescoço para baixo. Tirando alguns amigos próximos, ninguém sabe que a jovem estudante é CamGirl. Acima de tudo, receia que pais, colegas de faculdade ou futuros colegas de trabalho descubram o que faz a partir das 22h00. Tendo em conta que vive com os pais, tem de ter cuidados para não ser «apanhada» enquanto trabalha. Para isso, quando começa os seus espectáculos tranca a porta e tem muito cuidado a arrastar os móveis do quarto para criar o espaço de trabalho.

«Disse-lhes [pais] que trabalho à noite, até para justificar a entrada de dinheiro. Acham que estou a fazer coisas relacionadas com a minha área de estudo. Eles estão na sala eu no quarto. Fecho a porta à chave e começo a trabalhar»

Para que não suspeitem de nada, Bruna também desliga o microfone durante os shows e fala com os clientes apenas através do chat de mensagens escritas. «Devo ser a única CamModel que não tem som. Mas não há problema porque consigo fazer tudo ao mesmo tempo. A verdade é que eles voltam sempre porque o serviço é bom.»

«Na faculdade e na minha família o sexo é um tema ainda rodeado de preconceitos»

Bruna explica que os pais, apesar de serem «muito boas pessoas», são religiosos e «um produto da sociedade em que vivemos, que não está habituada a falar de sexualidade com normalidade». Por isso, prefere não revelar este lado da sua vida. Contudo, se um dia descobrirem, tem esperança de que «consigam aceitar». «Somos uma família muito humilde. Apesar de [os pais] até serem bastante ‘para a frente’, não são o suficiente para aceitarem a minha profissão»

Para mais, Bruna também tem medo de que pessoas com quem lida no seu quotidiano a discriminem por ser CamModel. Considera que, em Portugal, falar de sexualidade ainda é tabu. «Noto na faculdade e na minha família que o sexo é um tema ainda rodeado de preconceitos. Não se fala de sexualidade com naturalidade. Fala-se como se o sexo não fosse normal. Gostava que isso mudasse. Por isso, luto. Vou fazendo a minha parte embora ainda não me sinta preparada para dar a cara. Espero um dia ser ainda mais conhecida para ter mais força e capacidade de mudar um bocadinho as mentalidades de alguns portugueses.»

Dinheiro e clientes: «Não tenho um ordenado milionário, como muitas pessoas pensam»

Bruna Valentino
«Dá para viver sozinha com uma renda de 350 euros»

No que diz respeito à industria do sexo, muito se especula sobre os ganhos exorbitantes e sobre as relações estabelecidas com clientes. Sobre os valores, Bruna refere que tem em atenção que os «ordenados dos portugueses não dão para pedir os mesmos preços que as CamGirls internacionais pedem».

De acordo com a experiência que tem, diz-nos que no estrangeiro as CamModels mais bem-sucedidas podem chegar a ganhar três mil euros em cinco horas. No entanto, em Portugal, a conjuntura não é a mesma. Bruna tem «pacotes para todas as carteiras», mas todos os espectáculos incluem striptease e masturbação com brinquedos». A única variante é o tempo a que os clientes assistem. Há três packs: B’Silver (10min/14 euros), B’Gold (15min/17 euros) e B’Diamong (20min/22 euros).

Apesar de o fluxo de clientes variar muito de noite para noite e de ser difícil identificar uma média dos ganhos, garante que é possível viver-se como CamModel. Contudo, «não dá para grandes luxos».« Dá para viver sozinha com uma renda de 350 euros.»

«Não tenho um ordenado milionário, como muitas pessoas pensam. Para além de ter de parar por causa da menstruação, às vezes também tenho de descansar porque é um trabalho muito desgastante a nível físico»

Estando ainda a viver em casa dos pais, Bruna explica que é «muito forreta» e que poupa quase tudo o que ganha com o objectivo de juntar para, mais tarde, comprar uma casa. «Também é um meio para atingir os meus sonhos.»

«Tenho muitos jovens entre os 20 e os 25 anos»

Bruna apenas tem clientes do sexo masculino, apesar de não ter 100% de certeza. Uns clientes mostram-se na webcam e outros não. Entre o carinho e o profissionalismo, contou-nos que tem clientes de todas as idades, dos 20 aos 70 anos. «Pergunto sempre se são maiores de idade. Sinceramente, tenho clientes de todas as idades. O pessoal mais velho, às vezes, não sabe usar o Skype e eu tenho de lhes ensinar.»

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À cerca da regularidade dos clientes, diz ter muitos habituais e casados. «Tenho clientes que vêm dia sim, dia não. E depois tenho aqueles que, todas as sextas-feiras e sábados, estão lá para relaxarem um bocadinho. Muitos homens estão com as mulheres em casa e vão dez minutos à casa de banho para me verem.»

Sobre o facto dos clientes estarem numa relação e procurarem os seus serviços, Bruna julga que os homens não partilham com as mulheres porque não conseguem comunicar ou realizar as suas fantasias sexuais com elas. Para Bruna, os seus serviços servem o mesmo propósito que a pornografia: viver de alguma forma certos desejos sexuais.

«Não acho que seja traição, como muitas pessoas acham. Não há qualquer envolvimento emocional. É só aquilo. Um escape de vez em quando. Um divertimento que faz parte da vida»

Bruna acrescenta que o que faz é «pornografia mais interessante». «Grande maioria das pessoas vê pornografia. Se se estiver numa relação, não se deixa de ver pornografia. E isto é o mesmo. Só que em vez de se estar a ver um vídeo que todas as pessoas estão a ver, os clientes pagam por aquele bocadinho só comigo.»

Bruna Valentino
«Mesmo durante o dia falo com os meus clientes»

Sobre os comportamentos dos clientes, enquanto faz o seu show, conta que muitos homens escolhem só falar ou que ficam apenas a observá-la sem se masturbarem. Estes comportamentos ocorrem principalmente com clientes mais velhos.

Desde fevereiro, já fez «muitas amizades». Longe de uma relação amorosa, denota que conheceu pessoas «na sua maioria muito interessantes». «Tenho um cliente, desde junho, de quem me tornei mesmo amiga. Mesmo durante o dia falo com os meus clientes. Gostam que eu tire aquele tempo à noite para eles, embora por vezes, também gostem de fazer conversa, de perguntar-me como é que estou, como foi o meu dia…»

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«Todos os dias tenho de dizer que não sou prostituta, sou CamModel»

Existem alguns pontos mais complicados na gestão da relação com os clientes. Bruna conhece muitas pessoas que confundem os serviços que presta com prostituição. Muitos homens tentam ter outras atividades sexuais com a jovem. «Todos querem mais. Eu diria que 95% querem mais. Tentam aliciar-me, ao dizerem que me pagam bem por outros serviços. É desgastante estar sempre a dizer o mesmo. Todos os dias digo que sou CamModel, não sou prostituta»

Muitos clientes «são muito desagradáveis», desabafa. Passam dos limites quando recusa prostituir-se. «Esta semana, recebi a minha primeira ameaça no Instagram, exactamente porque me recusei a ser prostituta.»

Bruna Valentino
«Lá porque trabalho na indústria do sexo, não quer dizer que tenho de fazer tudo»

Ter uma relação amorosa e ser CamModel: Um casamento possível

Atendendo ao facto de muitas pessoas considerarem que um trabalho na indústria do sexo dificulta o bom funcionamento de um relacionamento amoroso, sobretudo monogâmico, Bruna explica como tem gerido a vida amorosa sendo uma CamModel.«Não consigo ver-me a apaixonar-me por um cliente, porque eles conhecem a ‘Bruna’ e não a mim. Não sabem quem sou. A ‘Bruna’ sou eu, mas muito mais liberal e com à-vontade. É uma mulher exibicionista.»

Não obstante, não vê no seu trabalho um obstáculo para um namoro no sentido mais tradicional, tendo em conta que as pessoas que a atraem e lhe despertam interesse tendem a ter valores parecidos com os dela. «Como sou liberal e de mente aberta, também tendo a dar-me com pessoas que pensam da mesma forma.»

Na sua última relação, revelou logo no primeiro encontro que era CamModel. No entanto, ao contrário do que se poderia esperar, o relacionamento não resultou porque o  parceiro apaixonou-se pela ‘Bruna’ e não por ela. «Tive uma relação, desde fevereiro. Ele reagiu muito bem. Nunca se sentiu ameaçado e tinha muito curiosidade no que eu fazia. Mas depois percebi que para ele eu era interessante por causa da ‘Bruna’ e não por mim.»

Depois desta experiência, retirou que seria melhor esperar e conhecer melhor a pessoa com quem estiver antes de contar que trabalha na indústria do sexo para ter a certeza de que o interesse da outra pessoa é genuinamente em si. «Agora, com o meu próximo namorado quero que nos conheçamos bem antes de contar o que faço, para não ter esse risco.»

Bruna Valentino
«Nunca se sentiu ameaçado, tinha muito curiosidade no que eu fazia»

«As cuequinhas apareceram antes da Bruna Valentino»

Menos falado na esfera pública está o mercado de venda de artigos íntimos. Bruna garante-nos que este é um mercado mais requisitado do que muitos imaginam. Vende cuecas e brinquedos que utiliza nos shows ou na sua vida privada a clientes. Este negócio surgiu muito antes de a ‘Bruna’ ter sido criada.

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«Tudo começou quando coloquei roupa à venda no OLX. Blusas, vestidos, saias e sapatos. Do nada comecei a receber muitas mensagens de homens a dizerem que me pagavam pela minha roupa interior usada. Mas mesmo muitos homens. Ao início, detestava aquela abordagem. Não fazia qualquer sentido. Bloqueava logo as pessoas e denunciava-as. Mas depois percebi que era um negócio como outro qualquer e comecei a vender cuequinhas.»

Após o surgimento da ‘Bruna’, a estudante juntou os dois negócios e, atualmente, também vende os próprios brinquedos sexuais que usa nos shows. «Assim consigo ter sempre brinquedos novos e os clientes podem ficar com uma memória física do show que tiveram comigo.»

«Consigo imaginar-me casada, com filhos e a ser CamGirl»

Sobre a permanência de ‘Bruna’ na sua vida, a modelo erótica vê no amanhã um mar de possibilidades e desfechos. Por um lado, confessa que pode deixar de ter tanta popularidade na área como tem de momento, pois esta é uma indústria que vive muito das novidades.«Há sempre pessoas novas a aparecer. Agora sou eu que estou na moda, mas daqui a um mês ou um ano, há de aparecer outra novidade. É cíclico e posso sofrer com isso».

Por outro lado, revela que o mercado do sexo também é uma indústria muito diversificada, com espaço para todos. «Há gostos para tudo.» Bruna refere que mesmo à medida que for envelhecendo pode enquadrar-se nas categorias de «maduras» ou «MILFS». Num futuro mais próximo, gostava de poder conciliar o trabalho sexual com o futuro emprego que virá a ter, eventualmente na sua área de estudo. «Espero conseguir conciliar com a ‘Bruna’. Nem que seja só à sexta-feira e ao sábado.»

Daqui a uns anos, Bruna não esconde o seu desejo de crescer na área do sexo. «Consigo imaginar-me casada, com filhos e a ser CamGirl. Adorava ter a minha casa com um quarto de trabalho, que é como todas as CamGirls têm lá fora.

Reportagem: Mafalda Tello Silva
Fotografias disponibilizadas por Bruna Valentino
Imagem: João Rui Silva
Edição: Shauna Ashley

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