Parem a destruição da Natureza ou sofram mais e piores pandemias, alertam cientistas
É provável que a pandemia do nov coronavírus seja seguida por surtos de doenças ainda mais mortais e destrutivas, a menos que a destruição desenfreada do mundo natural seja rapidamente interrompida.
É provável que a pandemia do novo coronavírus seja seguida por surtos de doenças ainda mais mortais e destrutivas, a menos que a causa – a destruição desenfreada do mundo natural – seja rapidamente interrompida. Trata-se de um alerta de alguns dos principais especialistas em biodiversidade do mundo ouvidos pelo jornal The Guardian, esta semana. «Há uma única espécie responsável pela pandemia de covid-19 – nós», considera este painel científico.
«As pandemias recentes são consequência direta da atividade humana. Particularmente fruto dos sistemas financeiros e económicos globais, que valorizam o crescimento económico a qualquer custo. Temos uma pequena janela de oportunidade para superar os desafios da crise atual, para evitar semear as sementes de um futuro ainda mais negro do que aquele por que passamos hoje.»
Destruição acelerada dos sistemas naturais são a «tempestade perfeita» para novas pandemias
Os professores Josef Settele, Sandra Díaz e Eduardo Brondizio lideraram o estudo de saúde planetária mais abrangente já realizado, publicado em 2019 pela Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas sobre Serviços de Biodiversidade e Ecossistemas (IPBES). A conclusão foi a de que a sociedade humana estava ameaçada pelo declínio acelerado dos sistemas naturais de suporte à vida da Terra.
Num artigo publicado na segunda-feira, 27 de abril, com a participação de Peter Daszak, que prepara a próxima avaliação do IPBES, conclui-se que o «desmatamento desenfreado, a expansão descontrolada da agricultura, a agricultura intensiva, a mineração e o desenvolvimento de infraestruturas, bem como a exploração de espécies selvagens, criaram uma tempestade perfeita para a propagação de doenças».
«A saúde é global, independentemente do tipo de ser vivo e a de cada um influencia a do outros
Estas atividades causam pandemias ao colocar mais pessoas em contacto e ao entrar em conflito com a fauna, dos quais 70% das doenças humanas emergentes se originam, consideram estes cientistas. A combinação da urbanização com o crescimento explosivo das viagens aéreas globais permitiu que um vírus inofensivo nos morcegos asiáticos levasse ao «sofrimento humano incalculável e interrompesse economias e sociedades em todo o mundo.»
«Esta é a mão humana na emergência de uma pandemia. No entanto, a covid-19 pode ser apenas a primeira de novas pandemias» mais graves e mortíferas. «É provável que as pandemias futuras ocorram com mais frequência, se espalhem mais rapidamente, tenham maior impacto económico e matem mais pessoas, se não tomarmos muito cuidado com os possíveis impactos das escolhas que fazemos hoje.»
A saúde é global, independentemente do tipo de ser vivo e a de cada um influencia a do outros
Os cientistas afirmam ainda que os pacotes de recuperação económica de vários biliões de euros lançados pelos governos devem ser usados para fortalecer e reforçar a proteção ambiental, antes de tudo o resto. «Pode ser politicamente conveniente relaxar os padrões ambientais e sustentar indústrias como agricultura intensiva, companhias aéreas e empresas de combustíveis fósseis – setores de energia dependentes de combustível –, mas fazê-lo sem exigir mudanças urgentes e fundamentais subsidia essencialmente o surgimento de futuras pandemias.» Porque «a saúde das pessoas está intimamente ligada à saúde da vida selvagem, à saúde do gado e à saúde do meio ambiente». Na verdade, a saúde é global, independentemente do tipo de ser vivo e a de cada um influencia a do outros» diz Daszak.
Prevenir será sempre menos oneroso do que remediar
Além disso, os programas de vigilância e os serviços de saúde devem ser adequadamente financiados pelas nações na linha de frente do risco de pandemias, avisam. «Isto não é um simples ato de altruísmo. É um investimento vital no interesse comum para evitar futuros surtos globais.» Daszak acrescenta que «os programas a que nos referimos custarão dezenas de biliões de euros por ano». Ainda assim, será «muito menos oneroso do que as consequências de uma nova pandemia, cujos efeitos levam à exigência de triliões de euros para cessar o surto e restabelecer os padrões de vida».
«Deixar de cuidar do planeta significa não cuidar de nós próprios»
«Os negócios tal como os conhecemos deixarão de funcionar. Agora, como de costume, os negócios param e esperam por uma vacina. Esta não é uma boa estratégia.» Ainda em março, o responsável da ONU pelo meio ambiente, Inger Andersen, dizia, também ao Guardian, que «a natureza está a enviar-nos um aviso» com a pandemia do novo coronavírus e a atual crise climática. Diz-nos que deixar de cuidar do planeta significa não cuidar de nós próprios, humanos.
Na semana passada, o secretário-geral da ONU, António Guterres, incitou os governos a aproveitarem a oportunidade de «regressarem melhor» após a pandemia, criando sociedades «mais sustentáveis e resilientes».
«Podemos sair da crise atual mais fortes e resistentes do que nunca se elegermos ações que protejam a natureza»
Este sábado, 25 de abril, o professor Thomas Lovejoy, da Fundação das Nações Unidas e da Universidade George Mason, nos EUA, criador em 1980 do termo «biodiversidade», afirmou que a pandemia «não é a vingança da natureza». É, antes, a consequência dos nossos atos. «Fizemo-lo a nós próprios. É a consequência da nossa persistente e excessiva intrusão na natureza e o vasto comércio ilegal de animais selvagens. Em particular, os mercados de animais selvagens, os mercados de agrícolas do sul da Ásia e os mercados de carne de animais da África», diagnosticou.
No início de abril, um vasto estudo levou à conclusão de que o impacto humano na vida selvagem era o responsável direto pela disseminação de vírus. Os especialistas em biodiversidade são unânimes. «Podemos sair da crise atual mais fortes e resistentes do que nunca se elegermos ações que protejam a natureza. Se o fizermos, a natureza irá proteger-nos também.»
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