Neemias Queta, do Vale da Amoreira para o mundo da NBA
O documentário sobre a chegada de Neemias Queta à NBA foi apresentado nesta terça-feira, no Campo Pequeno. A curta-metragem mostra o percurso –quase sempre difícil – do primeiro português a chegar à principal divisão norte-americana.
O documentário “Dream Big: Neemias Queta“, com estreia agendada para as 20h00 desta quarta-feira, faz o retrato da ainda curta – mas difícil – carreira do basquetebolista português. Desde que começou a jogar no Barreirense, com passagem pelo Benfica e a chegada aos Estados Unidos, aos Utah State Aggies. Agora, chegou à NBA (liga norte-americana). Ainda assim, a verdade é que o basquetebol não foi a primeira opção. “Tinha dois pés esquerdos para jogar futebol e demorava uma eternidade para passar a bola”, atiram, entre risos, familiares e amigos. Foi então que decidiu mudar para o basquetebol e ingressou nos escalões de formação do Barreirense. Nos primeiros tempos na equipa do Barreiro, tinha a alcunha de “esfregona” por passar mais tempo no chão do que em pé.
Um dos momentos altos é a reunião familiar no Vale da Amoreira para assistir ao draft. Entre sorrisos e lágrimas, a família perde-se em abraços e rebentam-se confettis. A emoção e felicidade estampada em cada rosto. “Só queria abraçá-lo”, ouve-se. Era o momento pelo qual todos ansiavam: Neemias Queta tornava-se, aos 21 anos, o primeiro português na NBA. Da autoria do realizador português André Braz, esta curta-metragem é um salto constante entre o dia em que foi o 39.º a ser escolhido no draft da NBA e como foi crescer naquela freguesia da Moita. “Na verdade, não me pediram muito para este desafio de fazer o documentário. Fui eu que meio o inventei. Em março/abril soube que o Neemias se iria candidatar ao draft da NBA, comecei a investigar um bocadinho mais a sua história, quem era, de onde vinha, e fui ficando cada vez mais interessado”, começa por dizer. “É uma pessoa que tem uma personalidade muito cativante. É de uma doçura extrema, de uma grande humildade. E tudo isto, com 2,13 metros, torna-se muito mais impactante”.
Para além das dificuldades provocadas pela pandemia – que obrigou o realizador a contratar uma equipa de filmagens em Los Angeles – também a escassez de informação foi um dos grandes desafios. “Não existe nada sobre o Neemias. Era um desconhecido do público e dos meios. Vai para os Estados Unidos e perde-se a pista dele. Reconstruir toda a carreira dele é muito complicado. Não havia imagens de arquivo; tive de contactar muitas pessoas.” Da parte de Neemias, “houve sempre muita abertura”, destaca.
«O Neemias é que tinha mudado a vida dele»
“Ele tinha muita vontade que este filme fosse feito, para contar a história dele às pessoas. A parte que mais me surpreende é uma frase dita por um dos treinadores dele nos Utah. Disse-lhe que ia mudar a vida do Neemias, mas que passado estes anos o Neemias é que tinha mudado a vida dele. Isto revela a personalidade do Neemias. Ele tem um impacto muito grande nas pessoas que o rodeiam”, lembrou. O objetivo é continuar a contar a história do português. “Adoraria fazer uma segunda parte porque, como as pessoas vão perceber ao verem o filme, é alguém com uma personalidade muito própria. A história acabou de começar”.
A ante-estreia teve lugar nesta terça-feira, no cinema do Campo Pequeno, em Lisboa. Antes da apresentação do documentário, o público foi brindado com uma mensagem em vídeo do atual jogador dos Stockton Kings, clube da formação de Sacramento na G-League (liga secundária). “Quero agradecer a toda a gente que está na estreia do meu filme. Espero que consigam aprender um pouco mais do que foi a minha vida. Este documentário conseguiu retratar muito bem o que se passou na minha vida, o que tive de superar para poder crescer tanto como pessoa, como como atleta. Tanto dentro de campo, como fora dele, sinto que Deus tem muitas bênçãos para mim no futuro. Obrigado”, disse.
«É um rapaz com a cabeça no sitio»
Para o selecionador português de basquetebol, Mário Gomes, a presença de Neemias na NBA dá “tempo de antena” à modalidade em Portugal. “Como homem do basquetebol, espero que tenha um impacto muito grande na nossa juventude, para que haja uma adesão maior à modalidade. E que, obviamente, com a participação de Neemias na seleção nacional, possamos subir patamares competitivos. Só tem vantagens. Pode ser mesmo muito importante para o nosso basquete. Há que trabalhar para aproveitar a onda”, frisou. “Penso que se vai afirmar na NBA. É um rapaz com a cabeça no sítio. Tem a mentalidade apropriada para singrar. Não esquece de onde vem. Ele vai ser um marco histórico na modalidade”, sublinhou.
Já o presidente da Federação Portuguesa de Basquetebol, Manuel Fernandes, não tem dúvidas que Neemias será uma referência para os jovens não só pelas suas qualidades físicas, mas também como pessoa. “Antes de ir para os Estados Unidos, ele tinha uma proposta do Valência. Eu disse-lhe para aproveitar, porque assim nem precisaria de andar nos drafts. E ele disse-me que já sabia disso e que o dinheiro até ajudaria a família. O treinador dos Utah State Aggies foi falar com ele ao Vale da Amoreira e comprometeu-se que iria para lá e não teve coragem de negar a proposta. Só isso mostra bem a cabeça bem organizada que tem. Também nisso é um modelo”, disse.
O dirigente revelou ainda que a Federação vai criar o “Campo de basquetebol Neemias”. Neemias nada pediu para si. “Pediu para os alunos da escola do ensino básico do Vale da Amoreira, onde estudou, receberem t-shirts com a sua imagem, e o Barreirense, onde se iniciou na modalidade, 500 bolas de mini-basquete ao longo dos próximos anos para que o clube possa promover novos jogadores”.
Também Ben Queta, primo de Neemias, esteve presente no Campo Pequeno e lembrou que o jogador é “um exemplo de pessoa, de profissional e atleta”. “A base dele é a família. Foi isso que o ajudou e que o apoiou desde o início e até agora. Essa é a base fundamental que ficará com ele para sempre. É uma pessoa como qualquer outra. A diferença do Neemias para as outras pessoas, se calhar, é a educação que teve e a dedicação que tem tido ao projeto a que se propôs desde o início. E é isso que tem feito a diferença”, explicou.
Texto: Tomás Cascão
Fotos: Nuno Moreira
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